O Mar e as Mudanças Climáticas
Por Natalia Pirani Ghilardi-Lopes, 2013. O Mar e as Mudanças Climáticas: efeito das mudanças climáticas sobre as comunidades marinhas.
(Fontes: Berchez, Oliveira Filho, Amâncio, & Ghilardi, 2008; Ghilardi, Hadel, & Berchez, 2012)
Dentre as principais consequências das mudanças climáticas (MCs) sobre o mar podemos citar: alterações no hidrodinamismo, aquecimento da água, variação do nível médio do mar e acidificação da água.
O hidrodinamismo nada mais é do que o movimento da água do mar, como aquele ocasionado pelas correntes, ondas e maré. A interação das massas de ar atmosféricas com a água pode levar à ocorrência das tempestades, ressacas, furacões, ciclones e mesmo outros distúrbios atmosféricos de menor intensidade. Sua importância no caso das mudanças climáticas é bastante grande, uma vez que se preveem alterações significativas na intensidade de tempestades. Em consequência, as comunidades bentônicas marinhas podem sofrer alterações grandes em sua estrutura, sendo que as populações de algumas espécies inclusive não consigam se recuperar antes da ocorrência de novos distúrbios, o que poderia leva-las à extinção.
Dentre as alterações globais esperadas como resultado do acúmulo do CO2 na atmosfera está o aumento médio da temperatura da biosfera e, consequentemente, também da água do mar. Como a temperatura é um fator-chave na distribuição dos organismos, mesmo pequenas variações podem ter efeitos significativos nas comunidades e espera-se que haja a alteração no padrão de distribuição geográfica de várias espécies marinhas, com migrações de espécies equatoriais e tropicais para latitudes maiores do globo e possivelmente a extinção de espécies adaptadas às temperaturas mais frias. Também já foi demonstrado que o aquecimento da água superficial está relacionado à morte de corais. Esse fenômeno é conhecido como “branqueamento” e é causado pela morte das algas associadas aos corais, denominadas zooxantelas, e que são essenciais para a sua sobrevivência. Como as interações ecológicas são complexas e os limites de tolerância à temperatura variam de espécie para espécie, muitas alterações nas comunidades são difíceis de prever.
Outro efeito esperado em função do aumento global da temperatura do planeta está relacionado ao aumento do nível médio do mar, consequência do derretimento do gelo das calotas polares e da dilatação da água do mar, que embora pequena pode ser significativa em decorrência do volume total dos oceanos. Isso é particularmente importante para os seres vivos que habitam e são adaptados às condições existentes na região litorânea, a qual será invadida e submersa pela água. Organismos da região do mediolitoral, por exemplo, estão adaptados à variação diária do nível do mar ocasionado pelas marés e ficam parte do dia submersos e parte do dia emersos. Com a elevação do nível médio do mar, estes organismos permaneceriam submersos por todo o dia e possivelmente seriam substituídos por outros, adaptados à submersão constante. Poderíamos prever o deslocamento dos organismos de mediolitoral para regiões mais altas, entretanto isso só é possível caso exista substrato disponível para este deslocamento. Caso contrário, muitas espécies exclusivas de médiolitoral podem também ser extintas em decorrência do aumento do nível médio do mar.
Finalmente, em relação à acidificação da água do mar, sabemos que cerca de um terço do dióxido de carbono (CO2) liberado na atmosfera se dissolve no oceano. A reação do CO2 com a água forma ácido carbônico que, por sua vez, reage com os íons carbonato presentes na água, resultando na liberação de íons H+ e no aumento da acidez. Estima-se que desde o início da era industrial o pH dos oceanos tenha sofrido uma queda média de 0,1 unidade devendo cair mais 0,3 até o final do século. Isso promove impactos na fisiologia dos organismos e provoca alterações no sistema carbonato, comprometendo a sobrevivência de algas calcárias e de animais como moluscos, corais, crustáceos e outros animais que produzem exoesqueletos calcificados, uma vez que em águas muito ácidas o balanço químico do sistema carbonato pode se inverter, prevalecendo a dissolução do carbonato de cálcio acumulado nos oceanos ao invés de sua deposição. O resultado disto é que ao invés de absorção, haverá emissão de CO2 pelos oceanos agravando ainda mais o efeito estufa.
Embora seja muito difícil se prever o que realmente acontecerá, uma vez que há ciclos naturais pelos quais as comunidades marinhas vêm passando há milhões de anos, se considerarmos a interação entre esses distúrbios, as consequências tornam-se bastante preocupantes, fazendo com que estudos mais aprofundados mereçam atenção emergencial da comunidade científica e toda a sociedade.
Nesse sentido, a discussão em programas de Educação Ambiental, em todos os espaços de ensino, sejam eles formais ou não, é de grande importância não somente para informar, mas também para estimular um maior número de discussões sobre as possíveis soluções que podemos adotar, coletivamente, para evitarmos que o planeta atinja níveis críticos de alteração das comunidades marinhas e de perda irreversível de biodiversidade.
Referências bibliográficas
Berchez, F. A. S., Oliveira Filho, E. C., Amâncio, C. E., & Ghilardi, N. P. (2008). Possíveis impactos das mudanças climátcias globais nas comunidades de organismos marinhos bentônicos da costa brasileira. In M. Buckeridge (Ed.), Biologia & Mudanças Climáticas no Brasil (pp. 167-180). São Carlos: RiMa Editora.
Ghilardi, N. P., Hadel, V. F., & Berchez, F. (2012). Guia para Educação Ambiental em Costões Rochosos. Porto Alegre: Artmed.